You know nothing, John Snow

Game of Thrones e a sua filosofia constitucional são inesquecíveis. A impressão que dá é que nunca haverá um show igual, que una todo mundo e tenha o poder de parar tudo: colocando no mesmo lugar as mais diferentes pessoas, dos mais diversos backgrounds.

A hora da série é o momento em que você encontra na mesma sala de estar o seu tio conservador e a sua amiga progressista. Ambos com concepções distintíssimas dos crimes e das penas, mas estão lá juntos: para assistir o grand finale de Game of Thrones.

Em GoT, as teorias conspiratórias fazem parte do dia-a-dia brasileiro (you know nothing, John Snow) e nunca na história deste país uma série de televisão teve a popularidade de uma novela das 8. É um fenômeno, que está chegando ao fim.

Você pode ter conhecido a série pelos spoilers nas redes sociais ou pela indicação insistente de amigos, que te levaram a sentar literalmente no trono do rei. Você pode ter assistido a série desde a sua primeira temporada ou corrido este ano para assistir tudo de uma vez só: à espera do grand finale. Nada disso importa tanto quanto as relações com o direito que veremos agora.

A Política Está Vindo…

A série ainda está recente nos nossos corações, mas é incrível pensar que Donald Trump ainda era o apresentador do “Aprendiz”, quando, em 2011, o drama da HBO estreou.

Dilma Rousseff também estreava no governo junto com Game of Thrones e mal sabíamos que a nossa concepção de impeachment iria mudar. O inverno estava chegando e com ele descobriríamos que depor um presidente do poder era uma questão de força parlamentar. Que não haveria nada que o Supremo Tribunal Federal pudesse fazer para impedir os donos do poder de levar os seus planos à frente.

O Direito Constitucional Brasileiro é uma avenida parlamentar, com um conceito de impeachment aberto e múltiplos crimes de responsabilidade na Lei de Impeachment, onde um atraso na publicação de uma Lei ou a frustração na ordenação de um pagamento é capaz de depor o Presidente da República.

Atualmente, vemos como o Presidente Jair Bolsonaro precisa pisar em ovos para lidar com Rodrigo Maia. Não sem razão ele é cauteloso. O Presidente da Câmara dos Deputados tem poder para inaugurar o processo do impeachment a partir de uma denúncia, que qualquer cidadão pode oferecer.

Este é o nosso sistema de freios e contrapesos, que nos lembra que a política bate sempre à porta do direito nos finais de semana, para jogar cartas e combinar o jogo.

A obra de George R. R. Martin veio às telas com um mundo de nobres Starks, trapaceiros Lannisters e despossuídos Targaryens, que podem jogar segundo as suas regras, mas que jamais esquecem a maior delas: a política dá as cartas e sobrevive quem souber jogá-la.

A Constituição colhe os fatores reais de poder e pode até conseguir modificá-los excepcionalmente, mas sempre a partir de um jogo de forças entre os poderes constituído e o poder constituinte.

Filosofia Constitucional: Tem que ter estômago

Você se lembra quando a rainha Daenerys comeu o coração de um cavalo? Legal, apesar de nojento.

Então, é exatamente isto: esqueça aqueles conceitos massantes e excessivamente ordenados, que o seu professor de direito colocava no quadro, se quiser aprender a filosofia constitucional; se quiser saber de direito constitucional.

Se você quiser transitar pelo direito “mais político de todos”, então você também precisa aprender a jogá-lo. Precisa ter estômago para aprender o direito como ele é. Só assim você conseguirá olhar para o cenário político e identificar a dinâmica dos conceitos constitucionais: como eles se fazem na vida política.

Você não sabe direito constitucional (e não importa quanto títulos tenha), se você não souber olhar para o ambiente político e, por instinto, extrair os conceitos e montar o cenário constitucional. Será vulnerável, como John Snow contemplando a árvore, sem perceber o momento da chegada da Arya Stark.

Se você quer entender de filosofia constitucional, precisa ter o desejo de ocupar o trono de ferro. Afinal, quem quer a coroa aprende mais rápido os caminhos para obtê-la… Se não tiver a cabeça decepada, é claro.